quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

O carneiro revoltado

Certo carneiro muito inteligente, mas indisciplinado, reparou os benefícios que a lã espalhava em toda parte e, desde então, julgou-se melhor que os outros seres da criação, passando a revoltar-se contra a tosquia.

– Se era tão precioso – pensava –, por que aceitar a humilhação daquela tesoura enorme? Experimentava intenso frio, de tempos a tempos, e, despreocupado das ricas rações que recebia no redil, detinha-se apenas no exame dos prejuízos que supunha sofrer.

Muito amargurado, dirigiu-se ao Criador, exclamando:

– Meu Pai, não estou satisfeito com a minha pelagem. A tosquia é um tormento... Modifica-me, Senhor!...

O Todo-Poderoso indagou, com bondade:

– Que desejas que eu faça?

Vaidosamente, o carneiro respondeu:

– Quero que a minha lã seja toda de ouro.

A rogativa foi satisfeita.

Contudo, assim que o orgulhoso ovino se mostrou cheio de pelos preciosos, várias pessoas ambiciosas atacaram-no sem piedade. Arrancaram-lhe, violentamente, todos os fios, deixando-o em chagas.

O infeliz, a lastimar-se, correu para o Altíssimo e implorou:

– Meu Pai, muda-me novamente! não posso exibir lã dourada.., encontraria sempre salteadores sem compaixão.

O Sábio dos Sábios perguntou:

– Que queres que eu faça?

O animal, tocado pela mania de grandeza, suplicou:

– Quero que a minha lã seja lavrada em porcelana primorosa.

Assim foi feito.

Entretanto, logo que tornou ao vale, apareceu no céu enorme ventania, que lhe quebrou todos os fios, dilacerando-lhe a carne.

Regressou, aflito, ao Todo-Misericordioso e queixou-se:

– Pai, renova-me!... A porcelana não resiste ao vento... estou exausto...

Disse-lhe o Senhor:

– Que desejas que eu faça?

– A fim de não provocar os ladrões e nem ferir-me com porcelana quebrada, quero que a minha lã seja feita de mel.

O Criador satisfez o pedido.

Todavia, logo que o pobre se achou no redil, bandos de moscas asquerosas cobriram-no em cheio e, por mais corresse campo afora, não evitou que elas lhe sugassem os fios adocicados.

O mísero voltou ao Altíssimo e implorou:

– Pai, modifica-me... as moscas deixaram-me em sangue!

O Senhor indagou, de novo, com inexaurível paciência:

– Que queres que eu faça?

Dessa vez, o carneiro pensou mais tempo e considerou:

– Suponho que seria mais feliz se tivesse minha lã semelhante às folhas de alface.

O Todo-Bondoso atendeu-lhe mais uma vez a vontade e o carneiro voltou à planície, na caprichosa alegria de parecer diferente.

No entanto, quando alguns cavalos lhe puseram os olhos, não conseguiu melhor sorte. Os equinos prenderam-no com os dentes e, depois de lhe comerem a lã, abocanharam-lhe o corpo.

O carneiro correu na direção do Juiz Supremo, gotejando sangue das chagas profundas, e, em lágrimas, gemeu, humilde:

– Meu Pai, não suporto mais!...

Como soluçasse longamente, o Todo-Compassivo, vendo que ele se arrependera com sinceridade, observou:

– Reanima-te, meu filho! que pedes agora?

O infeliz replicou, em pranto:

– Pai, quero voltar a ser um carneiro comum, como sempre fui. Não pretendo a superioridade sobre meus irmãos. Hoje sei que os meus tosquiadores de outro tempo são meus verdadeiros amigos. Nunca me deixaram em feridas e sempre me deram de comer e beber, carinhosamente... Quero ser simples e útil, qual me fizeste, Senhor!...

O Pai sorriu, bondoso, abençoou-o com ternura e falou:

– Volta e segue teu caminho em paz. Compreendeste, enfim, que meus desígnios são justos. Cada criatura está colocada, por minha Lei, no lugar que lhe compete e, se pretendes receber, aprende a dar.

Então o carneiro, envergonhado, mas satisfeito, voltou para o vale, misturou-se com os outros e daí por diante foi muito feliz.

 
 Neio Lúcio 

Do livro Alvorada Cristã, obra mediúnica psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A vida tem sentido e é importante que nos lembremos disso


No mesmo jornal, com diferença de apenas 15 dias, lemos as declarações abaixo, dadas por pessoas formadas na mesma disciplina, a Psicologia:

“Acho que a gente procura sentido demais para a vida. Uma das razões para a infelicidade, acho, vem dessa incapacidade de viver com leveza, de conviver com o fato de que a vida não tem sentido.” (Contardo Calligaris, psicanalista italiano, em entrevista publicada na Gazeta do Povo, 4 de janeiro de 2016, pág. 8.) (Negritamos.)

“O desenvolvimento da dependência está relacionado a cinco componentes: familiar, psicológico, biológico, espiritual e social. (...) o componente espiritual tem a ver com a percepção de sentido para a vida. É muito menor a experimentação de drogas e a repetição do uso entre jovens que têm relação com a espiritualidade.” (Raphael Mestres, psicólogo, mestrando em Dependências Químicas pela Universidad del Salvador, em Buenos Aires, e coautor do livro Não dá nada, sobre dependência química, em entrevista publicada na Gazeta do Povo, em 19 e 20 de dezembro de 2015, pág. 31.) (Negritamos.)
A vida, segundo o psicanalista Calligaris, não tem sentido. Diferente é a opinião das pessoas a quem o psicólogo Raphael Mestres se refere.
Afinal, a vida tem ou não tem sentido?
É claro que a vida tem, sim, sentido. Ela não é um tiro no escuro, nem uma novela a que falta um editor ou uma direção.
O leitor pode pensar que é dogmaticamente que assim nos expressamos, ignorando que a doutrina espírita não é feita de dogmas, nem é fruto de decisões conciliares ou de decretos papais. Muito diferente disso, ela se fundamenta no depoimento, confirmado milhares de vezes, de pessoas que também nutriam pensamentos equivocados, mas um dia, retornando à vida verdadeira, tiveram de rever seus conceitos.
Reportamo-nos a isso em fevereiro de 2014 quando comentamos neste mesmo espaço o livro Perante Deus, a primeira obra de autoria de Erick, pseudônimo utilizado por ilustre escritor brasileiro, que a transmitiu por intermédio da médium Célia Xavier de Camargo, nossa companheira de redação nesta revista.(1)
A visão que Erick tinha da vida e do mundo, quando estava encarnado, era totalmente diversa da visão de Erick-desencarnado.
Inconformado com as desigualdades, as injustiças e as mazelas da sociedade terrena, Erick rejeitara, em vida, a ideia de Deus e, como consequência, tudo quanto decorresse daquilo que chamamos fé. A vida, para ele, como o é para Contardo Calligaris, não tinha sentido.
Adveio-lhe, no entanto, a bendita desencarnação e Erick pôde, enfim, perceber com os próprios olhos que a vida e o mundo obedecem a um planejamento meticuloso e que, na execução desse planejamento, é forte a presença do Criador e dos Benfeitores espirituais que a bondade do Pai permite que nos assistam, para que não nos afastemos do rumo que é preciso seguir para atingirmos a meta para a qual todos fomos criados.
Lemos na principal obra espírita a seguinte resposta dada pelos imortais à pergunta “Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?”:

“Deus lhes impõe a encarnação com o fim de fazê-los chegar à perfeição. Para uns, é expiação; para outros, missão. Mas, para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal: nisso é que está a expiação. Visa ainda outro fim a encarnação: o de pôr o Espírito em condições de suportar a parte que lhe toca na obra da criação. Para executá-la é que, em cada mundo, toma o Espírito um instrumento, de harmonia com a matéria essencial desse mundo, a fim de aí cumprir, daquele ponto de vista, as ordens de Deus. É assim que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta.” (O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, questão 132.)
Que existem muitos Ericks por aqui, cremos que ninguém ignora.
É, porém, uma pena que seja preciso que desencarnem para alterar sua visão com respeito à vida, ao mundo e, sobretudo, com relação a Deus, nosso Criador, a quem tudo devemos.


(1) O texto mencionado, intitulado Perante Deus, pode ser acessado clicando-se neste link: http://www.oconsolador.com.br/ano7/350/editorial.html