segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Enquanto não se inventa um GPS sentimental

Já publiquei aqui outros textos da professora e psicóloga Mônica El Bayeh e já disse também que sou fã do que ela escreve. Muitas vezes ela diz exatamente o que eu gostaria de ter dito. Neste texto publicado no blog Mulher 7 X 7  ela comenta a dificuldade de escolher os caminhos nos momentos de crise.

O texto era lindo.  Falava de estar junto.  Para qualquer coisa.  Amor incondicional.  Sem problemas.  Um mundo inteiro pela frente, como comercial de creme dental ou margarina.  Felizes.  Satisfeitos.  Completos.  Sem angústias, brigas, opiniões divergentes.  Perfeitos.  Uma vida só de sim!  Um sim para sempre.
Lembrei uma conversa recente de, numa cidade interior.  Será que a internet pegava?  Sim.  Não.  Sim.  Não.  Sim.  Não.  Dependendo do dia, só não. Relacionamentos são assim também, como o sinal dessa cidadezinha.  Tem dias de sim.  Dão sinal.  Correspondem.  Dão retorno, a conexão é rápida, falam o que você precisava ouvir. E dias de não. Suas mensagens não chegam, o sinal cai, te deixando na mão, falando sozinha. Fura quando você mais precisava.  Nenhum feedback, consideração zero. No máximo, um clichê surrado qualquer avisa que está indisponível.  A velocidade some, dá página não encontrada, servidor com defeito. E você fica no vácuo.
Relações são assim. Dias de sim.  Dias de não. Momentos intercalados.
Nos dias sim, paixão no ar.  Música de Roberto Carlos.  Esse cara é ele!  A felicidade mora ali naquelas pessoas, há tudo o que alguém deseja para alcançar seus desejos.  Se é que se precisa de alguém para ser feliz.  Porque, de verdade, felicidade vem em pacotinhos.  Embalagens individuais.  Cada um com as suas, juntando com a do outro, ficando maior.  Só que depender do pacotinho alheio….é mau sinal.  Ninguém gosta de dividir seu pacote de felicidade.  Mas, não mesmo.  Felicidade se soma, multiplica.  Dividir?  Nunca.  Casais felizes – melhor, relações felizes – são aquelas onde há comunhão parcial de bens: ele entra com a felicidade que já tinha antes do casamento, herdada de sua família, de seus amigos, de sua forma de se colocar e buscar satisfação.  Ela, a mesma coisa.  Juntos, construirão uma felicidade nova, próspera,  a dois.
Mas, mesmo com vários pacotinhos em estoque, a vida apronta das suas.  Todo mundo tem seus dias de ser chato, aqueles em que se acorda meio azedo.  Olha e coloca defeito em tudo e em todos.  Bufa.  Reclama.  Nesses dias, é difícil ficar perto. Ideal seria ter um lugar onde guardar a pessoa, em segurança, até que o bom humor retornasse.
Só que, de repente, numa jogada trivial, alguém pisa na bola.  Erra o drible, perde o pênalti. Decepciona.  Você esperava uma coisa, se depara com outra.  Então murcha, enrola a bandeira, muda de camisa.  Aquele time, nem sabe mais…  Talvez vire a casaca.  Confiava tanto.  Torceu.  Investiu.  Esperava mais empenho em troca.
Mas…não se conheciam?  Não sabia até adivinhar seu pensamento?  Nem todos. Sempre tem aqueles que não se conta.  Para ninguém.  Nem em confissão. É assim.
Uma rasteira na sua confiança?  Pega de surpresa, você cai de um tombo só.  Vai parar na lona.  Nocauteada.  Sem nem saber como foi.
Ninguém conhece ninguém completamente. Todo mundo tem sua caixa preta.  Lacrada.  Senão, ninguém entrava para viajar junto.  De bom e de ruim, temos coleções completas.
A gente se mostra aos poucos.  Senão, foge todo mundo.  Não fica um nem para contar a história.  Esse fantasma da solidão dá um medo enorme. Então, enquanto dá, a gente maloca. De verdade, a gente só mostra quando vacila.  E, na vacilada, o outro descobre os podres.  Fazer o que?
Descobrir os podres alheios dói.  Balança.  Tonteia.  Uns podres são piores do que outros.  O cheiro espalha.  Atordoa.
Não é de se espantar que haja muitos dias de não.  Dias de muitos nãos.  Épocas às vezes longas, quando nos perguntamos se vale continuar,  o que ainda estamos fazendo ali.  Desalentada, senta para pensar.  E se pergunta: E agora?
Numa hora dessas é que a vida bifurca.  E você freia sem saber que rumo tomar.
Com sorte, o tempo passa, diminui os tons.  As cores que berravam vão emudecendo. Incomodando menos? Não exatamente. Vai se aprendendo o jeito de lidar.  E o casal acaba ficando junto.  Até que o próximo susto os separe.  Ou não.
Nesses momentos de crise, tristes descobertas, é necessário ter ajuda.  Afinal, é estrada até então desconhecida. E cada crise é diferente. Não se entra duas vezes na mesma crise. Como o rio de Heráclito. Nessa estrada nova, ninguém sabe o que vem pela frente.  Se é esburacada, e tem quebra-molas, pardais, curvas perigosas, neblina, animais na pista. Ou, ainda a pior das hipóteses. Se a própria criatura é o animal na pista. Daqueles que não saem e também não deixam passar.
Seria tão bom que houvesse uma espécie de GPS sentimental. Um GPS conjugal. Hoje, a terapia de família tem, em parte, essa função.  Motoristas perdidos precisam de ajuda. Pena que na hora de desabafar, nem sempre se acerte na ajuda escolhida. Ouve-se comentários ácidos do tipo: Vai ficar com ele assim mesmo? Depois de tudo? Sério? E uma relação pode se dissolver antes do tempo sem necessidade. .
Há pessoas tipo GPS.  Fingem que ajudam, mas jogam na direção errada, são felizes com a tristeza alheia.  Elas não têm seus pacotes próprios de felicidade. Ou tem, mas não sabem usar. Funcionam em regime de cota reduzida.  E são peritas em fornecer artilharia.
O ideal é quando o GPS sentimental diz: recalculando! Caminhos sempre podem ser refeitos, repensados, recalculados. Sempre.

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